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Revista do Projeto Pedagógico IV - Orientação aos gestores das unidades escolares 6. Bullyng Escolar: O Outro Lado da Escola É
comum encontrar entre os adultos uma quantidade considerável
que tráz consigo as marcas dos traumas que adquiriram nos bancos
escolares. São seqüelas que se evidenciam pelos prejuízos
em aspectos essenciais à realização na vida, como
dificuldades de lidar com perdas, relações afetivas, familiares
e sociais, ou no desempenho profissional. Essas pessoas foram submetidas
às diversas formas de maus-tratos psicológicos, verbais,
físicos, morais, sexuais e materiais, através de zoações,
apelidos pejorativos, difamações, ameaças, perseguições,
exclusões. Brincadeiras próprias da idade? Não.
Esses atos agressivos, intencionais e repetitivos, que ocorrem sem motivação
evidente, em desigualdade de poder, caracterizam o bullying escolar.
O bullying
tem sido ao longo do tempo, motivo de traumas e sofrimentos para muitos,
sendo ignorado pela maioria das pessoas, por acreditar tratar-se de
"brincadeiras próprias da idade" ou ser necessário
ao amadurecimento do indivíduo, sem, contudo, considerar os danos
causados aos envolvidos. Os
estudos sobre o bullying escolar tiveram início na Suécia,
na década de 70 e na Noruega, na década de 80. Aos poucos,
vem se intensificando nas escolas dos mais diversos países, sendo
possível quantificá-lo em índices que variam de
5% a 35% de envolvimento. No Brasil, os estudos são recentes,
motivo pelo qual a maioria dos brasileiros desconhece o tema, sua gravidade
e abrangência. Pesquisas realizadas na região de São
José do Rio Preto, interior paulista, (FANTE, 2000/03) e no município
do Rio de Janeiro, (ABRAPIA, 2002), com o intuito de reconhecer a incidência
bullying, revelaram que, em média, 45% dos estudantes de escolas
públicas e privadas, estão envolvidos no fenômeno.
Estudos desenvolvidos pelo Instituto SM para a Educação,
em cinco países (Espanha, Argentina, México, Chile, Brasil),
evidenciaram que o Brasil se tornou campeão em bullying. Sem
termo equivalente na língua portuguesa, que expresse sua abrangência
e formas de ataques, o tema desperta crescente interesse e preocupação
entre os pais e profissionais das áreas de educação,
saúde e segurança pública, devido aos prejuízos
emocionais causados e por seu poder propagador capaz de envolver crianças
nos primeiros anos de escolaridade. O comportamento
bullying pode ser identificado em qualquer faixa etária e nível
de escolaridade. Entre três e quatro anos, podemos perceber tanto
o comportamento abusivo, manipulador, dominador, quanto o passivo, submisso
e indefeso. Porém, a maior incidência está entre
os alunos de 3ª a 8ª séries, período em que,
progressivamente, os papéis dos protagonistas se definem com
maior clareza. Estudos
demonstraram que a média de idade de maior incidência entre
os agressores, situa-se na casa dos 13 a 14 anos, enquanto que as vítimas
possuem em média, 11 anos. Fato que vem a comprovar que os papéis
dos protagonistas e as formas de maus-tratos empregadas se intensificam,
conforme aumenta o grau de escolaridade. Geralmente,
os ataques são produzidos por um grupo de agressores, reduzindo
as possibilidades de defesa das vítimas. As estratégias
de ataques, normalmente, são ardilosas e sutis, expondo as vítimas
ao medo, à humilhação e ao constrangimento público.
Os agressores se valem de sua força física ou psicológica,
além da sua popularidade para dominar, subjugar e colocar sob
pressão, o "bode expiatório". Entretanto, torna-se
evidente entre eles a insegurança, a necessidade de chamar a
atenção para si, de pertencer a um grupo, de dominar,
associado à inabilidade de expressar seus sentimentos e emoções.
Por isso, a escolha das vítimas, privilegia aquelas que não
dispõe de habilidades de defesa. Com
o tempo, as vítimas se sentem solitárias, incompreendidas
e excluídas de um contexto que prima pela inclusão de
todos. As conseqüências do bullying incidem no processo de
socialização e de aprendizagem, bem como na saúde
física e emocional, especialmente das vítimas, que se
isolam dos demais, carregando consigo uma série de sentimentos
negativos que comprometem a estruturação da personalidade
e da auto-estima, além da incerteza de estarem em um ambiente
educativo seguro, onde possam se desenvolver plenamente. Em casos extremos,
algumas vítimas executam seus planos de vingança, seguidos
de suicídio. Nos
Estados Unidos, pelo menos 37 tiroteios ocorridos em escolas foram atribuídos
ao bullying. O massacre de Columbine é um exemplo de como a vítima
pode se transformar em agressor. Na pacata cidade de Taiuva (SP), após
anos de ridicularizações, um jovem entra armado na escola,
atira contra 50 estudantes e dá cabo à existência.
Em Remanso (BA), um adolescente mata seu agressor principal, um garoto
de 13 anos e a secretária do curso de informática.. Em
Petrolina (PE), uma adolescente e seu colega asfixiam uma garota de
13 anos, por ser alvo de apelidos pejorativos. O bullying
é um fenômeno psicossocial expansivo, por isso considerado
epidêmico, comprometedor do pleno desenvolvimento do indivíduo,
por suas conseqüências psicológicas, emocionais, sociais
e cognitivas, que se estendem para além do período acadêmico.
Dentre
as causas desse tipo de comportamento podemos citar os modelos educativos
introjetados na primeira infância. O tipo de experiência
vivenciada pela criança no ambiente familiar, poderá predispô-la
a tornar-se uma protagonista do fenômeno. Para o seu pleno desenvolvimento
a criança necessita sentir-se amada, valorizada, aceita, incentivada
à auto-expressão e ao diálogo, principalmente na
adolescência, porém a noção de limites precisa
ser estabelecida com firmeza e com coerência. No
entanto, quando no ambiente familiar há o predomínio de
superproteção, modelo que inibe o desenvolvimento da capacidade
de autonomia, de tomada de decisões, de exploração
do ambiente e de defesa; ou o perfeccionismo, com alto nível
de exigências e cobranças, mais do que elogios; ou a ambivalência,
onde constantemente ocorre oscilação do humor, gerando
muita insegurança pessoal; ou autoritarismo, com práticas
educativas que se valem de agressões verbais, morais, psicológicas
ou físicas; esses ingredientes psíquicos isolados ou somados,
favorecem o envolvimento da criança em comportamentos bullying
logo no início de sua experiência de socialização
educacional. São
cinco os papéis que caracterizam este fenômeno: vítimas
típicas, vítimas provocadoras, vítimas agressoras,
agressores e espectadores. Algumas constatações entre
os envolvidos: é comum que quem sofreu alguma das formas de ataque
reproduza os maus-tratos sofridos; os tipos de conseqüências
são abrangentes, de acordo com as características de cada
indivíduo e das características psicodinâmicas de
sua família; as vítimas encontram dificuldade de buscar
ajuda e quando buscam sentem dificuldade de serem compreendidas, além
do temor em relação à resposta dos pais, ou de
que a sua denúncia agrave ainda mais o seu problema. Dessa forma, estamos diante de um grande desafio. As dimensões identificadas do problema, nos remetem a olharmos para a lacuna que se evidencia na convivência familiar e escolar, pois é notório entre os alunos a carência afetiva e a ausência de modelos humanistas que lhes sirvam de referencial. Por isso, é necessário que as instituições de ensino invistam em conscientizar seus profissionais, pais e alunos sobre a relevância desse tema e desenvolvam estratégias preventivas, em parcerias com os diversos segmentos sociais, visando educar para a paz. E que a prática da solidariedade, cooperação, tolerância, empatia, respeito às diferenças e compaixão caracterizem a atitude de amor das instituições de ensino e da família, em busca da construção da paz. Cleo
Fante. Graduada em História e Pedagogia. Pós-graduada
em Didática do Ensino Superior. Doutoranda em Ciências
da Educação. Pesquisadora pioneira no Brasil, sobre o
Bullying Escolar. Autora do livro Fenômeno Bullying: como prevenir
a violência nas escolas e educar para paz (Verus Editora). Autora
do programa antibullying "Educar para a Paz". Diretora Geral
do Cemeobes (Centro Multidisciplinar de Estudos e Orientação
sobre o Bullying Escolar). Conferencista. |
Decálogo A nossa escola é, por previsão constitucional, pública e gratuita. Portanto, ela tem de ser custeada pelos cofres públicos. Todas
as omissões do Estado, com relação aos itens acima, deverão
ser objetos de ofícios da direção
às Diretorias Regionais de Ensino, a fim de isentarem o
diretor de eventuais responsabilidades administrativas. |