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UDEMO | 23/07/19 | Atualizado em 23/07/19 13:36


Matéria publicada no portal Revista Educação

Especialista fala sobre álcool e drogas e dá dicas de prevenção para as escolas

Eduardo Marini

O biólogo e educador Cesar Pazinatto, especialista em dependência química pela Universidade de São Paulo, atua há mais de duas décadas em consultoria para a prevenção do uso de álcool e drogas em escolas. Participou da implantação de programas sobre o tema em colégios, entre eles os paulistas Santo Américo e Bandeirantes.

Apoiado nessa experiência, e na colaboração da educadora Maria Estela Benedetti Zanini, ele escreveu, em parceria com Ilana Pinsky, doutora em Psicologia Médica pela Unifesp e pós-doutora pelo Robert Wood Johnson Medical School, o livro Álcool e drogas na adolescência – Um guia para pais e professores (Editora Contexto, 143 págs.).

Nesta entrevista a Educação, Pazinatto mostra-se preocupado com a aceleração do consumo de álcool por jovens e adolescentes, sobretudo a partir do ano 2000. Reclama da facilidade com que se compra e vende bebida no país, mesmo no caso de menores. E dá detalhes sobre os modelos de programa de prevenção de uso de drogas e álcool mais adotados nas escolas e redes escolares.

Os índices de consumo de álcool e drogas entre adolescentes e jovens estudantes brasileiros assustam o senhor?

Tudo nessa área é preocupante, o uso de drogas merece toda a nossa atenção, mas a explosão do consumo de bebida alcoólica nesta faixa etária, sobretudo a partir do ano 2000, fez com que os diretores e professores se dedicassem com maior ênfase à literatura e aos programas de prevenção de álcool e drogas. Vemos propaganda de bebida na tevê de manhã, vinculada a esporte. Nos mais de um milhão de pontos de venda de álcool do país, é cada vez mais raro ver o vendedor ou caixa conferir a idade do comprador com aparência de menor, no documento, para não vender álcool a um sub-18, o que é ilegal. E, quando o menor quer beber e é identificado, muitas vezes a questão é resolvida por alguém da turma com 18 anos ou mais. O Brasil é certamente um dos países onde se vende e compra álcool com maior liberdade e menor regulamentação do mundo. Se alguém vende bebida alcoólica na rua, quase nunca é cobrado para esclarecer a origem e legalidade do produto e, muito menos, se está vendendo para menores. É claro que essa avalanche precisa ser mais bem regulamentada e, sobretudo, fiscalizada.

Um dos capítulos do livro tem como título a pergunta Qual o papel da escola na prevenção das drogas? Fale um pouco sobre isso.

Neste ponto, Ilana e eu destacamos que as escolas são o espaço apropriado e quase obrigatório para o desenvolvimento de projetos e programas de prevenção de consumo de álcool e drogas, mesmo porque os Parâmetros Curriculares Nacionais, os PCNs, determinam a inclusão deste conteúdo dentro dos temas transversais. Alguns líderes escolares imaginam estar cumprindo as obrigações em relação a essa questão quando levam o assunto aos alunos diante de notícias de impacto como, por exemplo, a morte de alguém famoso por overdose. Isso é, sem dúvida, melhor do que ignorar totalmente o assunto, mas oferecer informações apenas nessas ocasiões está longe de ser o suficiente. É necessário fazer pesquisas em grupo com os alunos, agendar formação continuada para os professores e palestras para os jovens, observar empiricamente o cotidiano dos meninos e, importante, encarar e tratar de forma verdadeira, mas sem acusações e proselitismos, os casos de porte e consumo de drogas que surgem no interior da escola. Os professores estão em posição privilegiada para detectar jovens com o equilíbrio afetado por dificuldades de aprendizagem, problemas emocionais, estados depressivos ou outro problema de comportamento. Todos esses fatores podem levar o jovem a um comportamento de risco. Por isso, toda escola com pretensão de formar cidadãos plenos precisa ter um programa de prevenção, de preferência precoce e contínuo.

Em outro capítulo, vocês enumeram e fazem comentários sobre os modelos de prevenção mais comuns adotados pelas escolas e redes.

Isso mesmo. Foi uma tentativa nossa de ajudar o leitor a identificar os principais caminhos adotados, comparar seus principais pontos e formar opinião. O primeiro modelo é o que chamamos de Amedrontamento, ou seja, o de utilizar informações dramáticas e material ameaçador para supostamente conscientizar a garotada sobre os prejuízos causados pelo álcool e as drogas. Coisas como mostrar imagens de caveiras ou corpos debilitados fumando. Ou de levar os jovens a clínicas de recuperação para testemunhar o drama de dependentes. Esse modelo, de eficácia altamente duvidosa, está em pleno desuso. Na Pressão de Grupo Positiva, ou peer education, o objetivo é usar a influência positiva de um grupo sobre o outro. Alunos mais velhos preparados para conversar sobre o tema com os mais novos, por exemplo. No Conhecimento Científico, a ideia é passar informações comprovadas com sobriedade, sem viés religioso, moral ou ideológico. No modelo Educação para a Saúde, educa-se para uma vida saudável, e consequentemente livre de álcool, tabaco e droga, a partir do ambiente escolar, com atividades esportivas, lições de higiene e dicas para boa alimentação, entre outros pontos. No modelo de Treinamento de Resistência, o objetivo é preparar os jovens para resistir às pressões de consumir álcool e drogas.

De onde partem essas pressões?

Podem vir dos amigos, da internet, dos meios de comunicação e até mesmo da própria família, sobretudo no caso do álcool, algo que, como disse anteriormente, é bem mais comum do que se imagina. Além desses modelos, destacamos outros três: Educação Afetiva, Educação Normativa e Oferta de Alternativas. O primeiro tem como ponto central a solidificação da autoestima do adolescente, a partir de instrumentos como feira de ciências, música e atividades culturais. As informações sobre os malefícios causados pela droga são passadas em momentos calculados, ocasiões em que os jovens, fortalecidos, tenderão a dar muito mais valor a informações sobre coisas com potencial de gerar riscos à sua vida e saúde. Na Educação Normativa, procura-se convencer os jovens de que acreditar em lemas como “balada boa é a que tem birita” ou “bebo porque todo mundo na minha idade bebe” não é o melhor caminho. Uma boa atitude prática que ajuda a promover essa ideia é realizar festas na escola sem qualquer bebida alcoólica. Nem para adultos. Se possível, álcool nem no quentão cultural das festas juninas.

E aí vem a pergunta óbvia: qual desses modelos é o melhor?

A resposta que Ilana e eu damos, infelizmente, não é tão óbvia assim. Todas elas abrem espaço para acertos e sucessos em maior ou menor grau, mas, infelizmente, também para erros, fracassos e pouca efetividade. Conversar com especialistas e consultar pesquisas na área são os caminhos mais seguros para ajudar quem deseja montar um projeto de prevenção a encontrar o melhor caminho, o mais adequado ao projeto político-pedagógico da instituição. De maneira geral, a política de prevenção que chamamos de universal pode ser adotada na maioria suprema das escolas. Isso se torna possível com professores, diretores e outros profissionais da escola preparados por especialistas. Depois do treinamento, todos eles podem atuar nas turmas sem a presença dos pesquisadores que os formaram. Mais do que nunca, o fundamental a ser buscado é um modelo, ou um programa resultante da combinação de características de alguns deles, que dê possibilidade de mensurar resultados. Em uma questão importante como essa, medir a eficácia é algo indispensável.

 


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