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UDEMO | 11/11/19 10:03 | Atualizado em 13/11/19 9:11


Reclassificação – De novo !

Winston Churchill, primeiro-ministro britânico durante a segunda guerra mundial, costumava dizer que “A democracia é a pior forma de governo, com exceção de todas as demais”. Ou seja, a democracia é ruim, mas é boa.

Nessa linha, pode-se afirmar que na administração pública a descentralização visa à melhoria do serviço público. Então, a descentralização é boa, mas é ruim.

Democracia e descentralização costumam caminhar juntas, assim como suas opostas, a tirania e a centralização. Descentralização sugere, ainda, flexibilização.

O problema ocorre quando a descentralização fica nas mãos de centralizadores. Aí ela perde o sentido, “o bonde e a esperança”.

Vejamos alguns princípios e pressupostos da LDB - Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional - Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996:

  1. Descentralização: aparece em vários momentos na LDB, na expressão “a critério do respectivo sistema de ensino” e “de acordo com as normas do respectivo sistema de ensino”. Ou seja, cada sistema poderá adequar a norma à sua realidade. Mas não poderá contrariar a norma! Se o fizer, não será descentralização, mas sim usurpação!
  2. Valorização da capacidade: “acesso aos níveis mais elevados do ensino, da pesquisa e da criação artística, segundo a capacidade de cada um”. Ou seja, a capacidade deverá prevalecer sobre a formalidade. Com base nesse princípio, alunos que não concluíram a educação básica foram admitidos em universidades, amparados por decisões judiciais. O mais novo advogado do Brasil obteve a Carteira da OAB com 18 anos de idade.
  3. Foco no aluno: várias acomodações poderão ser feitas na escola, desde que “no interesse do processo de aprendizagem”. Uma delas é a reclassificação, procedimento que visa colocar o aluno no ano/série/etapa mais adequada ao seu desenvolvimento.
  4. Frequência obrigatória: “exigida a frequência mínima de setenta e cinco por cento do total de horas letivas para aprovação”. Esse é um dos poucos momentos em que a LDB é tão taxativa. Não há como “compensar ausências”. O aluno infrequente não poderá ser aprovado!
  5. Mecanismos de reforço/recuperação:  para os alunos de menor ou de baixo rendimento. Não se aplica à frequência !
  6. Nova composição dos níveis escolares –agora,há apenas dois níveis: educação básica e educação superior. A educação básica é um bloco único, formado pela educação infantil, ensino fundamental e ensino médio.

Vamos comparar esses princípios e pressupostos da LDB com a Resolução SE 60, de 29/10/2019, que “dispõe sobre a operacionalização da reclassificação de estudantes do Sistema Estadual de Ensino”, e que contraria (‘descaradamente’) a LDB.

  1. A reclassificação dos estudantes só poderá ocorrer para anos/séries mais avançadas do Ensino Fundamental e Médio, mesmo quando for recomendada a reclassificação para uma série menos avançada, por ser esta a mais adequada ao grau de desenvolvimento do aluno.
  2. Condição para a reclassificação do aluno é a comprovada “defasagem idade/ano/série de, no mínimo, 02 (dois) anos”. O aluno poderá ter a capacidade para acessar um nível mais elevado do ensino; porém, se ele não tiver a idade correspondente, nada feito! Neste caso, a formalidade (idade) subjuga a essência (capacidade)!
  3. Levou muito tempo para desvincular-se a frequência do aproveitamento, na LDB. Rapidamente, São Paulo ‘cortou as rédeas’, instituindo uma “fraude pedagógica” conhecida como “compensação de ausências”. Nessa linha, a Resolução SE 60 deixa claro que “poderá ser reclassificado, nos termos da presente resolução, o estudante que não obteve frequência mínima de75% do total de horas letivas para aprovação no ano anterior...”.
  4. A flexibilização foi engessada quando se determinou que a reclassificação, para o aluno da própria escola só poderá ocorrer até o final do primeiro mês letivo, mesmo que a necessidade do procedimento seja detectada posteriormente. Contraditoriamente, para alunos de outras escolas ou países, a reclassificação poderá ocorrer a qualquer momento, até o final do período letivo!
  5. Embora na nova composição dos níveis escolares a educação básica seja um bloco único, formado pela educação infantil, ensino fundamental e ensino médio (LDB); embora se afirme no caput do Artigo 3º da Res. SE 60/19, que “o estudante somente poderá avançar até o último ano/série do nível de escolarização pretendido”, “é vedada a reclassificação de estudante matriculado no Ensino Fundamental para o Ensino Médio...”. Justificativa: para evitar-se uma certificação precoce! Ensino Fundamental e Ensino Médio estão no mesmo bloco, no mesmo nível ! A conclusão do ensino fundamental não é pré-requisito para acesso ao Ensino Médio! Um aluno do ensino fundamental pode ir para a faculdade mas não pode ser reclassificado para o ensino médio !
  6. Vedou-se, ainda, a reclassificação aos estudantes matriculados na Educação de Jovens e Adultos - EJA, “por se tratar de modalidade de ensino voltada a público específico”. Aqui, nem com idade nem com capacidade consegue-se uma reclassificação, por se tratar de um “público específico”. Será que é a isso que se dá o nome de “discriminação”? Há um “público regular” e um outro público, o “público específico”? A redação é esta mesma: “público específico” e não “curso específico”.

Pobre LDB! Coitado do Darci Ribeiro, que acreditava tanto em democracia, descentralização e flexibilização!

Em resumo, em nome de uma LDB, a Resolução SE nº 60/19 contrariou, usurpou e descartou essa mesma LDB! E, desta vez, pegou (indevidamente) as escolas particulares e as municipais onde não houver sistema municipal.

É nisso que dá deixar a descentralização nas mãos de centralizadores!

Mas, também não se fazem tantas guerras em nome da paz ?

Resta o consolo de saber que, na situação caótica que as escolas públicas estaduais estão vivendo, a reclassificação de alunos é o nada, ou o quase-nada !

 


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