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UDEMO |04/07/17 11:15 | Atualizado em 4/07/17 11:19


Matéria publicada na Folha de São Paulo, 04 de julho de 2017.

Para aproveitar intercâmbio, o jovem tem que saber tomar decisões sem pais

Roseli Sayão

Há pais que querem que o filho adolescente faça um intercâmbio em outro país, seja para uma imersão em outra cultura e língua ou até para ganho de autonomia, que eles não têm ainda. Já outros são pressionados pelos filhos que querem fazer esse programa, mas não permitem, porque acham que o filho não tem maturidade para tanto.

Muitos têm a mesma dúvida: qual a idade ideal para um intercâmbio produtivo? Como gosto de fazer, vou trazer exemplos reais, levemente modificados, que irão nos ajudar a refletir sobre o assunto.

Marina, 17, é uma garota tímida, segundo ela mesma e os seus pais. Estudiosa, sempre aprendeu muito mais do que a escola exigia e tem um interesse especial pelas ciências exatas. Desde os 10 anos frequentava uma boa escola de inglês, mas não se sentia capaz de estabelecer uma conversa nessa língua, apesar de ouvir e ler muito bem. Em busca de ajudar a filha a resolver as duas questões –timidez e inibição na conversação em inglês– seus pais decidiram, no ano passado, enviá-la a um curso de três meses em Londres, cidade que ela mesma escolheu.

Ela afirma que aproveitou muito a viagem, apesar de ter sentido muito a falta dos pais, mas retornou com as mesmas questões que os levaram a encaminhá-la para essa viagem.

João, 16, era inquieto: vivia metido em encrencas e não aceitava a maioria das normas que deveria cumprir, tanto em casa quanto nas escolas que frequentou, que foram três.

Um tio recomendou aos pais do jovem uma viagem de intercâmbio para ficar na casa de uma família conhecida, muito rigorosa na educação dos filhos, também adolescentes. A viagem foi feita, e João retornou bem mais maduro: hoje, apesar de sempre contra-argumentar com os pais quando é orientado a fazer algo ou impedido de fazer ou ter o que quer, acata a autoridade deles, além de se responsabilizar pela organização de suas coisas em casa e na escola. Do jeito dele, é claro.

Não é a idade o principal sinalizador para os pais de que os jovens podem aproveitar bem uma viagem de intercâmbio. Eles são muito diferentes uns dos outros, mesmo que vivam em contextos familiares e sociais semelhantes.

Para aproveitar ao máximo uma viagem desse tipo, o adolescente já deve ter se emancipado da família, ou seja, seus pais não devem ser corresponsáveis por sua vida, como o são durante toda a infância.

O jovem não deve precisar da presença física próxima dos pais o tempo todo para tomar suas decisões e fazer suas escolhas, mas deve poder recorrer a eles sempre que sentir necessidade. Claro que eles irão tomar algumas decisões arriscadas, equivocadas e diferentes das que os pais gostariam, mas se não fizerem isso, não serão adolescentes: serão crianças em corpo de adolescente, o que é um risco para eles.

Além disso, uma viagem desse tipo não deve servir para solucionar questões que podem ser resolvidas em casa, com a tutela dos pais, como no segundo exemplo citado. João voltou diferente certamente porque foi levado a honrar os seus compromissos pela família com quem ficou, não é?

Uma viagem de intercâmbio pode ser muito bem aproveitada por alguns adolescentes, e por outros, não. Por isso, caro leitor, antes de tomar sua decisão, avalie os seus motivos, os de seu filho, converse com ele a respeito e, sobretudo, considere o conhecimento que você tem sobre ele para chegar à sua escolha. 


ROSELY SAYÃO é psicóloga e autora de "Como Educar Meu Filho?" (Publifolha)

 

 
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