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UDEMO | 31/03/15 9:36| Atualizado em 7/04/15 10:42


Matéria publicada na Folha de São Paulo, 31 de Março de 2015.

Pressão para estudar

ROSELY SAYÃO

Dias atrás, fotos e vídeos de um fato acontecido na Índia provocaram muitas reações e comentários, de todos os tipos. Para nós, a situação pareceu bizarra: pais escalando, perigosamente, prédios para passar cola aos filhos que faziam um exame que lhes daria ou negaria acesso aos estudos universitários. Mas será que essa imagem não tem mesmo nada a ver conosco? Vamos refletir.

O filho de uma amiga está com 16 anos e cursa o segundo ano do ensino médio. Ele pode ser considerado um bom menino: dedica-se com muito envolvimento a uma prática esportiva e leva a escola numa boa, estudando sempre que precisa.

Neste ano, a mãe está preocupada. Duas semanas após o início das aulas, o filho reclamou que, na escola, ele só ouvia falar em vestibular. E tudo o que ele ouvia se transformava em pressão para ele. Estudar, estudar, estudar: é isso que o garoto percebeu que tem como a missão mais importante em sua vida; é assim que ele –dizem– garantirá um bom futuro.

A mãe não deu muita importância ao fato: explicou a ele que cursar o ensino médio resultava nisso porque as escolas já vislumbravam exames como Enem e vestibular, e é bom para elas –as escolas– que seus alunos tenham bom rendimento. Recomendou ao jovem que ele seguisse em seu ritmo, que já era bom.

Alguns dias depois, passou no quarto do filho para desejar uma boa noite a ele, como sempre faz, e o encontrou dormindo na escrivaninha, com a cabeça caída sobre livros, apostilas, cadernos. Ela o acordou e pediu que fosse dormir na cama, mas ele respondeu que deveria continuar a estudar, mesmo cansado e com muito sono. Neste caso, a mãe não pactua com a atitude da escola de onerar seus alunos com uma enorme quantidade de estudos. Mas o garoto não consegue escapar às pressões, sociais e escolares.

Ainda não completamos um trimestre de aulas e uma quantidade enorme de crianças e jovens já faz o chamado reforço escolar. Crianças a partir de 6 anos (!) até jovens de 16 anos já têm mais esse compromisso, além de frequentar a escola.

A maioria dos pais atende de bom grado à sugestão da escola de que o filho estude com professores particulares, tutores, psicopedagogos e escolas especializadas. São poucos os que entendem que os filhos têm mais o que fazer para ficar com quase todo seu tempo comprometido com estudos escolares. E o que eles têm a fazer que é tão ou mais importante do que isso?

Depende da idade: eles têm de brincar, eles precisam –precisam!– de tempo de ócio para desabrochar, eles precisam tentar se conhecer e se entender –e isso em geral acontece na solidão, na relação deles consigo mesmos– e eles precisam escolher, pelo menos um pouco, o que querem fazer com a parte livre de seu tempo.

Temos investido muito nos estudos dos filhos, mas nos preocupamos em demasia com a quantidade de conteúdo que eles devem ver e rever e com o resultado das avaliações que eles fazem. Mas isso não tem resultado em muita coisa além de pressão, muita pressão sobre eles. Poucos reagem positivamente aos estudos com essas ajudas além da escola: eles reclamam e acabam por gostar menos ainda dos estudos.

Aprender a se esforçar talvez seja mais importante para eles. E com tantas aulas além da escola, são os outros que se esforçam por eles, não é?

Vamos pensar amorosamente em relação aos filhos e alunos nessa questão?


ROSELY SAYÃO é psicóloga e autora de "Como Educar Meu Filho?" (Publifolha)

 

 
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