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UDEMO | 10/02/15 09:38 | Atualizado em 10/02/15 9:40


Matéria publicada na Folha de São Paulo, 10 de Fevereiro de 2015.

Confiança

ROSELY SAYÃO

Ouço muitos pais dizerem que confiam no filho adolescente quando este tem de passar por algumas situações que se lhes apresentam como uma tentação. Por exemplo: quando permitem que ele viaje sem adultos antes mesmo de completar 16 anos, quando o autorizam a sair sem hora para voltar e sem destino previamente traçado, quando deixam o carro com a chave à mão em casa quando o filho lá fica sozinho ou quando passam a ele a senha do cartão do banco para que faça uma única compra combinada.

Eu entendo que os pais confiam na educação que deram ao filho, mas, quando isso se transforma em confiar no filho, a coisa complica. A educação que damos aos mais novos é a melhor herança que transmitimos a eles, mas não funciona como vacina, ou seja, os jovens podem adaptar o que aprenderam ao seu estilo de viver ou, em muitos casos, sucumbir aos seus impulsos e agir de modo diferente do que aprenderam ou de como costumam agir.

Em situações como as citadas, mais do que confiar no filho, é importante que os pais se lembrem de sua própria juventude. Poucos passaram por esse período sem fazer escolhas erradas, cometer bobagens e transgressões, das leves às arriscadas, não é?

Quando os pais pensam em confiança, o mais comum é a vontade que eles têm e o investimento que fazem para dar crédito ao filho. Mas talvez a questão crucial na relação entre pais e filhos seja seu corolário: como os pais podem se tornar merecedores da confiança de seus filhos.

Cultivar o vínculo: essa é a grande questão. A ligação afetiva dos pais com os filhos costuma ser bastante acolhedora logo nos primeiros anos de vida, e esse acolhimento oferece à criança a segurança que ela precisa para viver. Nesse período, tal acolhimento se expressa principalmente corporalmente: a criança se machuca, os pais a levam ao colo e/ou a acariciam; o bebê hesita em dar os primeiros passos, os pais o encorajam levando-o pelas mãos, e assim por diante.

Com o crescimento, a criança passa a procurar menos o contato corporal e a buscar o olhar dos pais. O olho no olho, a partir dos três anos, mais ou menos, significa para a criança a presença atenta dos pais, o que lhe dá a segurança de que precisa.

É durante a infância que a ligação entre o filho e seus pais vai tomando forma nas conversas, nas palavras, nas atitudes. E a criança mantém a confiança em seus pais quando percebe que eles estão verdadeiramente interessados nas questões que coloca e respondem a elas com transparência e honestidade.

É difícil para a criança confiar em seus pais quando percebe que eles pouco se interessam por aquilo que ocorre em sua vida. Você já deve ter ouvido um pai ou uma mãe dar uma resposta qualquer ao filho só para se desvencilhar do aborrecimento que ele provoca naquela hora, não é? Atitudes desse tipo vão, aos poucos, minando a confiança nos pais e aí, na adolescência, os jovens podem deixar de dar crédito a eles, mesmo sem se dar conta disso.

É importante considerar que confiar nos pais, para o adolescente, não significa contar tudo de sua vida, mas sim acioná-los nas situações em que precisar de um apoio, de uma orientação, de um auxílio para fazer as melhores escolhas possíveis em sua vida ou enfrentar os dilemas e as vicissitudes que surgem.

Para o jovem, saber que pode contar com seus pais mesmo quando não precisa mais deles é ter sentimento de pertencimento, fundamental na vida. 


ROSELY SAYÃO é psicóloga e autora de "Como Educar Meu Filho?" (Publifolha)

 

 
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