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Matéria publicada na Revista IstoÉ, 08 de abril de 2011

Como vencer o bullying

Claudia Jordão


Um terço dos adolescentes brasileiros diz sofrer agressões e intimidações na escola. Conheça alguns projetos para combater o problema que estão dando certo no Brasil e no Exterior


Isolado pelo grupo, o aluno não participa dos jogos e brincadeiras. Está sempre sozinho, é alvo de piadinhas jocosas, apelidos maldosos e, às vezes, apanha mesmo. Não é difícil reconhecer uma vítima de bullying, a criança ou adolescente que sofre violência física ou psicológica de forma constante e intencional por parte dos colegas. A prática está disseminada nas escolas, tanto no Exterior quanto no Brasil, e causa grande sofrimento para os alunos – gera ansiedade, pânico, insônia, cefaleia, entre outros – e para seus pais. Cerca de um terço dos estudantes do nono ano do ensino fundamental de 6.780 escolas do País, ouvidos para uma pesquisa do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) no ano passado, declarou sofrer bullying. O grande desafio de educadores, escolas e famílias é vencê-lo. Alguns projetos pioneiros indicam possíveis caminhos. Estudos científicos e experiências bem-sucedidas sugerem três vertentes a serem trabalhadas com os jovens: a empatia, a capacidade de se colocar no lugar do outro, a resiliência, a habilidade de reagir positivamente a uma situação adversa, e a criatividade, uma forma de canalizar o impulso agressivo para algum talento.

O primeiro passo, porém, é reconhecer que o fenômeno existe. “Pais e educadores não sabem diferenciá-lo de outros conflitos, não entendem que cada criança lida de maneira diferente com a violência e que muitas precisam de ajuda”, diz o psicólogo escolar e estudioso de bullying David Hornblas. Uma discussão aqui, um empurrão ali nem sempre são sinais do problema. O que faz a diferença é a intenção e a repetição das agressões. “Hoje em dia, tudo virou bullying, qualquer briguinha com um colega é justificada dessa forma”, diz Miriam Tricate, diretora do colégio Magno, em São Paulo. Para separar o joio do trigo, a escola promove encontros do corpo docente com psicólogos para que os episódios de bullying sejam identificados. Segundo Miriam, de cada dez casos trazidos pelos pais, apenas dois configuram a prática. Uma vez identificado o problema, parte-se para a ação. “Procuramos dar espaço para aquele aluno tímido que vive isolado mostrar o seu talento naquilo que gosta, por exemplo. Dessa forma, melhoramos a sua autoestima e a imagem dele para o grupo”, diz a diretora.

Ironicamente, no Brasil, as escolas públicas parecem estar mais bem preparadas para enfrentar o problema do que as particulares. A opinião é da psiquiatra e autora do livro “Bullying – Mentes Perigosas nas Escolas”, Ana Beatriz Barbosa Silva. “As públicas seguem o protocolo do Ministério da Educação”, diz Ana. “Casos de violência são registrados e encaminhados para o Conselho Tutelar, que vai até lá, apura e envolve educadores, pais e vítima na solução do problema.” Enquanto isso, muitas particulares ainda acreditam que admitir a existência de bullying é fazer marketing negativo. Além disso, quando reconhecem o problema e resolvem agir, nem sempre encontram apoio dos pais do aluno agressor – e, com medo de perdê-lo, têm dificuldade de agir. “Sempre recomendo aos pais: na hora de definir a escola do filho, não escolha a que não tem bullying, porque isso não existe. Escolha aquela que admite a existência e que mantém algum programa de prevenção e combate”, diz Ana, autora de uma cartilha anti-bullying recém-lançada pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ).

A Escola Estadual Melvin Jones, em Caxias do Sul (RS), usa a informação e o conhecimento como estratégia. No ano passado, as alunas do segundo ano do ensino médio, Edilene Antonelo Claudino, 17 anos, e Maruska Guarda da Silva, 16, desenvolveram um programa anti-bullying para ser aplicado aos alunos do quinto ano do ensino fundamental, baseado em palestras informativas e encontros entre pais e professores. “Os casos de bullying caíram pela metade só pelo fato de o discutirmos e mostrarmos que é errado”, diz a professora Jordana Montanari, orientadora do projeto das jovens. Edilene e Maruska sofriam com apelidos pejorativos – a primeira por ser baixa e a segunda por estar acima do peso. “Escolhemos crianças do quinto ano porque é nessa fase que as meninas engordam e os meninos ficam com a voz grossa, o que aumenta os conflitos”, diz Edilene.

Na última década, o ambiente fértil da internet fez prosperar uma forma nova de intimidação, o cyberbullying. “Protegidos pelo anonimato, os jovens fofocam, denigrem e humilham”, diz a psiquiatra Ana. “E as agressões permanecem eternamente no mundo digital, dificultando a cicatrização de feridas.” Pedir reparação na Justiça é uma alternativa que começa a ganhar visibilidade. No ano passado, um juiz de Minas Gerais determinou que os pais de um garoto que insultava a colega pagasse R$ 8 mil a ela por danos morais. Além disso, alguns governos estão tomando providências. Pelo menos quatro cidades brasileiras (Porto Alegre, Novo Hamburgo, Curitiba e Campo Grande) e o Estado de Pernambuco têm leis anti-bullying – São Paulo debate o projeto na Câmara de Vereadores. As escolas dessas localidades são obrigadas a manter um programa de combate ao problema e treinar professores para identificar e lidar com a questão.

A melhor alternativa, porém, é sem¬pre prevenir. Orientador educacional do Centro Educacional Pioneiro, de São Paulo, o psicólogo escolar Hornblas foi contratado para desenvolver um projeto anti-bullying. Ele é membro da organização britânica de combate à violência nas escolas United Kingdom Bullying e adaptou no Pioneiro um modelo de sucesso internacional. O primeiro passo é sensibilizar os estudantes para a questão. Em 2010, crianças entre 6 e 13 anos assistiram a filmes, ouviram palestras e debateram o tema. Neste ano, na segunda fase do projeto, os alunos irão participar de concursos de redação e da criação de cartazes sobre a violência nas escolas. Os melhores trabalhos serão distribuídos e espalhados pelas imediações da instituição, como forma de chamar a atenção para o problema. Na Grã-Bretanha, os cartazes feitos pelos alunos são afixados nas estações de metrô no entorno das escolas.